Janela.
Certo dia, quando acordei, ao abrir as janelas não havia a paisagem de sempre do lado de fora. Tinha um espelho. Um espelho grande, ocupando todo o meu campo de visão. Assustei, pois há muito não via aquela imagem tão despreparada. Os olhos arregalados, o cabelo bagunçado, o susto de me ver após aquele pesadelo tão real. Travei. Não consegui seguir. Fechei a janela. Nunca mais quero a abrir.
Quando você abre a janela,
o que você vê?
Quando você olha para fora,
você se vê?
Alguma vez, você já abriu a janela
e deu de cara com seus fantasmas?
Tive medo de abrir aquela janela de novo. Por muito tempo não o fiz. Fiquei no escuro, sem luz, sem me entender, sem ver. Fiquei naquele quarto, com todos os fantasmas me rondando. Todas histórias circulando em volta de mim. Fiquei ali. Sozinha. No escuro. Sem sentir. Sem me ver. Com medo demais de abrir a janela novamente. Com medo demais de ver aquela imagem.
Você já teve medo de abrir a janela?
Já esteve no escuro?
Alguma vez,
teve vontade de quebrar todos espelhos?
Naquele dia que abri a janela pela primeira vez, quis quebrar aquele espelho. Não pude. Fechei e nunca mais abri. Fiquei ali olhando para o teto, vendo tudo em preto e branco. Minha imagem doeu. Aquele rosto. Aqueles olhos. Aquele corpo. Já viram demais. Já sentiram demais. Dói demais vê-los sabendo o que já passaram.
Você já se olhou
e sua imagem doeu?
Quando você se vê,
você se enxerga?
Já teve que lutar
para não se enxergar?
Nunca havia me visto. Nunca havia me enxergado. O espelho do lado de fora, me mostrou o que tinha dentro. Me mostrou o que vinha negando. Me fez ver o que mais tenho medo. Me fez querer fugir, mas fugir era ir para dentro. O que me restava fazer, era fechar a janela.
Alguma vez,
você já fugiu para dentro?
Já abriu a janela
e não havia nada lá?
Certo dia, abri a janela com muito medo. Me vi. Chorei. Chorei pelo que nunca havia chorado. Aquela imagem tão igual a de antes, mas tão diferente. Aqueles olhos, que se firmaram e choraram. Aquele corpo tremendo, entendendo toda a situação. Me agarrei a janela. Me vi. Enxerguei cada pedaço e respeitei cada história vivida. Olhei para o todo e vi aquele conjunto de sorrisos, lágrimas, cicatrizes e traumas. Compreendi o quanto da minha história está na minha pele, mas também está dentro de mim, dentro de nós. Não tinha como eu ir para outro lugar.
Fui para dentro.
Autora: Maria C. A. Matos.
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